quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Para a melhoria do nosso trabalho político - Parte II


Encerrei a parte I do tema ''Para a melhordia do nosso trabalho político'', sem dar as devidas soluções ao problema em relação a Guiné Bissau e sua dirigências políticas, nessa postagem, apresento também soluções dada por Amilcar Cabral para uma nova estrutura e visão social dentro da nossa pátria.
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''Devemos cada dia seleccionar melhor os nossos dirigentes, os nossos responsáveis, os nossos militantes. Como vos disse, até hoje, para ser do nosso Partido, basta querer correr com os tugas da nossa terra, os tugas colonialistas, e querer o PAIGC. Há mesmo um juramento para o PAIGC. Fizemo-lo durante bastante tempo, mas depois parámos de o fazer. No começo, no tempo difícil, quando se entrava no Partido era preciso jurar e quem acreditava na cola, tinha que comer cola.
Acabámos com isso, depois, porque a luta cresceu muito, havia muita gente para comer cola, e até me lembro que o camarada Tiago, que punha as pessoas no Partido a fazer juramento, passou depois a sofrer um bocado porque comia muita cola. Acabámos um pouco com isso, mas no fundo, na consciência de cada um, quando entra no PAIGC, jura, mesmo que não fale, mesmo que não assine carta nenhuma. Mas a pouco e pouco, para ser militante do nosso Partido, é preciso dar provas concretas. Hoje ainda não; amanhã, para ser militante de facto do nosso Partido, é preciso dar provas concretas de que satisfaz certas condições, é preciso conhecer bem o Programa do Partido, é preciso saber o que é que o Partido quer, para o tomarmos em consciência, para não vir entrar e depois não saber o que era afinal. E cada dia devemos ser mais rigorosos com os nossos responsáveis e os nossos dirigentes; a cabeça tem que dar exemplo.
A autoridade tem que ser baseada no trabalho sério, no bom cumprimento do dever, e na conduta ou comportamento exemplar para toda a gente. Cada dia temos que exigir mais dos nossos responsáveis. Através da luta difícil que tivemos, formaram-se alguns responsáveis bastante razoáveis, mas devemos reconhecer que não tivemos tempo nem possibilidades de agir mais rigorosamente com outros responsáveis. Não vou repetir aqui todos os elogios que podemos fazer a alguns responsáveis do nosso Partido, sejam eles comissários políticos, membros de segurança, chefes de forças armadas, que têm trabalhado com bastante coragem, com bastante acerto, embora cometendo um ou outro erro de vez em quando. Não vou repetir também (já o disse através da minha conversa)os erros que os nossos responsáveis têm cometido. A crítica disso ainda é válida—fizemo-la já naquele documento que chamámos ''Sobre a reorganização das Forças Armadas'', e os nossos camaradas devem lê-lo, porque lá está escrito tudo claramente, abertamente, explicando até porque é que a maior parte dos nossos responsáveis que cometem mais erros, são aqueles que saíram das cidades.

Hoje, neste seminário, chamo a atenção dos camaradas para tudo quanto já criticámos através de outras conversas, e chamo a atenção dos camaradas para o facto de que chegou a hora de acabarmos com os erros dos responsáveis.
Chegou o momento de acabarmos com os responsáveis que quando recebem as palavras de ordem do Partido as deitam para o lado, guardam-nas para não se perderem, mas não lêem. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis ou dirigentes que nunca fazem um relatório sobre a situação do seu trabalho. Chegou a hora de acabarmos com os responsáveis de qualquer nível, mesmo dirigentes do Partido, que preferem a paródia à vida séria, de trabalho e estudo. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis e dirigentes que têm mais do que uma mulher e que, na luta, têm feito mais filhos que trabalho. Chegou o momento de acabarmos com os responsáveis e dirigentes que não são capazes de estudar para melhorarem os seus conhecimentos, mesmo no meio do mato, para serem cada dia
mais responsáveis, mais dirigentes a sério. Chegou o momento de acabarmos com os responsáveis ou dirigentes que, quando se lhes pergunta qualquer coisa sobre o seu trabalho, dizem mentiras. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis e dirigentes que são capazes de prejudicar os outros para não os deixarem avançar, com medo que lhes tirem o lugar. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis e dirigentes que, quando são transferidos para outro lado, pensam que vão para morrer, porque perderam o lugar, porque lá onde estavam já tinham formado o seu regulado.
Chegou o momento de acabarmos com responsáveis ou dirigentes que não são capazes de se entender com os seus camaradas numa Frente ou num Comité Inter-Regional. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis ou dirigentes que não querem que as nossas mulheres avancem também, para serem responsáveis ou dirigentes. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis e dirigentes que são capazes de não respeitar os dirigentes ou responsáveis que estão acima deles. Chegou o momento de acabarmos com responsáveis e dirigentes que não mostram em cada acto seu, amor pelo nosso Partido, respeito pela Direcção do nosso Partido, tendo em consideração que a coisa mais importante da sua vida é o trabalho do Partido.
Mas somos nós todos que temos de acabar com isso. Chegou o momento de acabarmos completamente com o medo dos responsáveis ou dirigentes do Partido. Não é necessário o medo pela autoridade. E quem abusa da autoridade está a cometer um crime pior do que os dos colonialistas portugueses. Chegou a hora também de levantarmos bem alto o nome daqueles militantes, responsáveis e dirigentes que têm sabido cumprir o trabalho do Partido, dando exemplo a outros, mostrando o caminho recto que devemos seguir no nosso trabalho. Cada responsável, cada dirigente, deve ter sempre bem presente que nós somos uma organização, por isso devemos estar organizados. Há camaradas que preferem coisas que não estão organizadas para escaparem ao controle. Há camaradas nossos que, se mandarmos alguém para ir ver o que eles estão a fazer, pensam que vai para os espiar. Chegou o momento de estabelecermos todo um serviço de controle como deve ser, para cada um sentir claramente se ele é dirigente ou responsável, que o controle e inspecção é para o servir, para o ajudar a andar cada vez melhor.
Chegou o momento de considerarmos como verdadeiros Comités do Partido, aqueles que são capazes de se reunir de facto, periodicamente, como o Partido manda, de estudar os problemas, como o Partido manda, de fazer relatórios, como o Partido manda. Quem não é capaz disso, não é dirigente nem responsável do Partido, não é Comité nenhum . É mentira, ele engana-se e está a enganar-nos. Chegou o momento de fazermos os nossos Comités de tabanca reunirem a sério, periodicamente, para discutirem os seus problemas, dar satisfação, e receberem também satisfação dos dirigentes dos Comités de Zona ou Inter-Região, para apalparem, tomaram pulso, para saberem o que se passa na nossa terra a sério , para resolverem os problemas antes que se tornem piores. E neste quadro, para garantirmos o futuro do nosso Partido, devemos fazer tudo, para fazermos avançar os camaradas novos que têm mostrado capacidade para serem responsáveis, para dirigirem.
E no quadro dessa necessidade, uma necessidade grande que se nos depara hoje é a de reforçar o nosso serviço de Segurança. Podemos trabalhar muito, morrer na luta, cansarmo-nos, apoquentarmo-nos, envelhecer, adoecer, etc., mas se deixarmos a «baga-baga» comer o nosso pau por dentro, qualquer dia encostamo-nos ao pau e ele cai porque já está todo podre. Baga-baga, tanto podem ser os agentes dos tugas no nosso meio, como nós mesmos, cada um de nós.
Por exemplo: é mais perigoso para nós um responsável ou um dirigente que se embebeda do que um agente dos tugas, porque ele, além de não cumprir o seu dever como deve ser, dá mau exemplo e, além disso, mata-se com bebidas. Ora o que querem os tugas é que ele morra mesmo, que ele não trabalhe bem. Um responsável ou dirigente do Partido cuja preocupação é, em qualquer lado que chegue, procurar as raparigas mais bonitas para conquistá-las, esse está a agir pior do que um agente dos tugas. Porque, primeiro, está a cortar-nos a possibilidade de dignificar, de levantar as mulheres da nossa terra; segundo, está a dar mau exemplo para toda a gente, tanto aos outros responsáveis como aos militantes e combatentes e, além disso, desmobiliza o nosso povo; terceiro, estraga a sua cabeça como dirigente, como responsável.
Um bom responsável do nosso Partido hoje, um bom dirigente, que cumpre o seu dever como deve ser e que tem consciência da nossa luta, tem que ser capaz, como um homem que tem necessidade de uma
mulher, ou como uma mulher que tem necessidade de um homem —porque é normal ter-se uma companhia —de escolher seriamente a sua companhia, para dar exemplo como deve ser. Nas condições da nossa terra, qualquer pessoa que manda pode ter, em geral, tantas mulheres quantas quer. Essa é que é a África de hoje ainda. Vejamos os ministros da África em geral: quantas mulheres têm? Mas não avançam nada com a sua terra. Temos que cortar isso na nossa terra completamente. Cada responsável ou dirigente nosso tem que dar exemplo, bons exemplos, para todos seguirem e para terem autoridade para castigar os outros quando chegar o momento de castigar.
Mas no quadro da nossa segurança temos que ver tudo isso, temos que ser vigilantes em relação a isso. Segurança não é só apanhar agentes dos tugas, evitar que o nosso povo vá vender arroz aos tugas. Esse é um problema, por exemplo, o de vender arroz; se nós trabalhássemos bem, controlássemos, podíamos até mandar a nossa gente ir vender arroz aos tugas para obter informações, para fazer espionagem e até também para obter certas coisas que nós não podemos ter ainda. Infelizmente, cremos que é um tanto difícil nas nossas condições. Mas a segurança também é o seguinte: ''eu estou ao teu lado, tu és dirigente, ages mal, digo-te claro: queixo-me de ti''.
Por exemplo; não é proibido beber, toda a gente pode beber, se não for muçulmano, mas na medida. Mas na medida é difícil, porque cada um tem a sua barriga. Devemos evitar a bebida ao máximo e um agente de segurança deve estar sempre pronto para condenar abertamente, seja comandante, dirigente do Partido, mesmo o Secretário Geral, com todo o respeito que tenha por eles; mas se se embebeda, prende-o. Isto é que é segurança. «Pára, porque estás a estragar o nosso trabalho,» isso é que é segurança de facto. Não aquela segurança que, para agradar ao responsável, arranja-lhe bebida e ainda faz paródia com ele. Esse não é segurança, esse é cúmplice na destruição da nossa luta.
Mas temos que reforçar a segurança da nossa luta, em relação ao inimigo. O inimigo está a trabalhar muito. Temos que reforçar a nossa segurança, com base nos nossos serviços de segurança, que temos que desenvolver cada vez mais, mais a sério. O Partido tem preparado muitos quadros no ramo da segurança. Infelizmente, vários não têm mostrado que aprenderam de facto, de verdade, esse trabalho, porque têm tido muita falta de iniciativa.
Temos que basear a nossa segurança no trabalho da nossa milícia popular, que é um instrumento de segurança nas nossas áreas libertadas. Temos feito esforço para organizar a nossa milícia popular, alguns responsáveis têm feito esforços, seja individualmente, seja no quadro dos nossos comités de milícia popular, ligados ao Comité Inter-Regional. Mas temos que fazer muito mais.
Temos que organizar a milícia popular, não como bigrupos, como alguns têm tendência para organizar, até para criar bases de milícia popular, não. A milícia popular é no meio do povo que deve estar, nas tabancas ou no meio do povo no mato. Os melhores filhos da nossa terra que estão nas tabancas e que ainda não entraram no Exército, esses é que devem ser a nossa milícia popular, bons militantes, que deram provas, jovens: segundo definimos, entre os 15 e os 30 anos de idade, para desempenharem um papel concreto, que é o reforço da nossa segurança e o trabalho de auto-defesa em relação tanto a ladrões que o inimigo manda, como em relação a invasões da parte do inimigo. A vanguarda da nossa população nas tabancas, nas áreas libertadas, deve ser a nossa Milícia Popular, ligada ao Comité Inter-Regional ao Comissário Político do Partido. Devemos formar dentro de cada área, grupos de milícia popular nas tabancas, e, entre diversas tabancas, podemos também formar grupos de milícia popular. Milícia Popular é gente que trabalha na sua casa, na lavoura, etc., mas quando for preciso, imediatamente, deve reunir-se, quando for preciso para um trabalho deve vir. Devemos treinar a nossa milícia popular na arte da guerra, na arte da vigilância, de fazer patrulhas, etc...
E devemos levar para diante aquela palavra de ordem do Partido que já foi dada, de armar a nossa milícia popular. Já se começou, mas ainda não se acabou até agora. Algumas armas enferrujaram, algumas estão na fronteira, à espera para serem entregues á milícia popular.
Outras armas chegaram às áreas da milícia popular, não foram distribuídas como deve ser e os tugas vieram e apanharam-nas ainda recentemente, na área de Fifioli, no sector 2 da Frente Leste. Há armas para a milícia popular tanto «Ricos», que pusemos à disposição da milícia popular, como carabinas de vários tipos, à disposição da milícia popular, que até hoje ainda não distribuímos como deve ser.
Devemos reforçar a nossa segurança, tanto armada como civil, pondo a trabalhar também elementos da população com armas nas mãos. Demos a palavra de ordem para armar a população. Nós mesmos começámos a armar a população na área de Quitáfine; a primeira distribuição de armas, fizemo-la nós mesmos. Esse trabalho não tem avançado como deve ser. Devemos, portanto, fazer força para melhorar isso, porque isso é melhorar o nosso trabalho político.
Outro trabalho importante que devemos fazer é reforçar a nossa organização, a nossa ligação com os centros urbanos onde o inimigo ainda está, melhorar a organização do Partido escondida nos centros urbanos. Mas quem está no mato como comissário político, como Comité Inter-Regional, como Comité de Zona, deve, na sua área, manter ligação estreita com os nossos camaradas e os nossos irmãos dentro das cidades que querem de facto lutar pelo nosso Partido. Temos que ser capazes de enviar agentes para as cidades para preparar a nossa gente, para trabalhar com a nossa gente. Raro, infelizmente, é o responsável do Partido que tenha feito isso a sério. Têm-se esquecido que a nossa terra também é nas cidades, seja Bissau, Bafatá, Bambadinca, Mansoa, Bissorã, Catió, etc. A verdade é que há alguns, tanto da segurança como políticos, que têm de facto desenvolvido o seu trabalho. Mas o que nós fizemos ainda não chega, temos que fazer muito mais. Temos que reforçar, e isso é um serviço da nossa segurança, principalmente, mas todos os nossos políticos, trabalhadores de política, devem reforçar a organização clandestina do nosso Partido dentro dos centros urbanos. Se não há em qualquer centro urbano, devemos ser capazes de mandar um ou dois destacados para lá, disfarçados, para organizarem como deve ser.
Isso é fundamental. Não podemos, de maneira nenhuma, preparar dezenas e dezenas de quadros para os serviços de segurança, aos quais se ensina o trabalho clandestino, espionagem, organização clandestina, trabalho com explosivos, etc., etc., contra-espionagem, observação, etc., para depois chegarem à nossa terra, sentarem-se e não fazerem nada. Um fulano não é da segurança porque é capaz de apanhar alguém que vai vender arroz aos tugas. Isso não chega. Chegou o momento de pormos essa gente da segurança a trabalhar mesmo nos centros urbanos, para estabelecerem novas organizações, para avançarem com o nosso Partido nesses lugares. Isso é fundamental.
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